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Mostrando postagens de julho, 2011

Miacontear - O mendigo Sexta-Feira jogando no Mundial

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Pobres , José Pádua "O que eu invejo, doutor, é quando o jogador cai no chão e se enrola e rebola a exibir bem alto as suas queixas. A dor dele faz parar o mundo. Um mundo cheio de dores verdadeiras pára perante a dor falsa de um futebolista. As minhas mágoas que são tantas e tão verdadeiras e nenhum árbitro manda parar a vida ara me atender, reboladinho que estou por dentro, rasteirado que fui pelos outros" ¹ É da literatura contemporânea o gosto pela história daqueles que estão à margem - histórica, social. Mais ainda das literaturas africanas, todas elas, tomadas pelo excessivo e brutal processo de exclusão do qual padeceu seu povo. Tenho observado pelos sujeitos miacoutianos de O fio das missangas essa característica de sujeitos descentrados ou em constante vias de formação ou ainda sujeitos de fronteira. São sujeitos representantes de uma variada gama de tipos sociais, tradicionalmente vítimas de processos discriminatórios e excludentes. Sujeitos deslocad

Cartas a um filho em coma, de R. Roldan-Roldan

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Por Pedro Fernandes A internet é uma ferramenta profícua às publicações literárias. Disso todos sabemos.  Quase t odo escritor ou aspirante a tem alguma coisa presa nesse universo paralelo: espaços como blogs e já agora as redes sociais para divulgação sobre seu trabalho e contato com o público leitor são exemplos disso. Até Saramago, no auge dos seus 87 anos, deu-se à aventura na "infinita página da web". Não é que resida aqui a salvação para a literatura ou para o escritor. João Ubaldo Ribeiro já disse mesmo que a internet é a perdição do escritor contemporâneo. E em termos de salvação literária não é porque esta pereça à sorte das parafernálias digitais. A literatura é perene e sempre foi, como toda arte, restrita a universo pequenos.  Mas a escrita e os escritores em alguns casos (ainda muitos), sim; e é uma pena: não é a internet que irão salvá-los.  As livrarias estão aí para não me deixar mentir: estão abarrotadas de livros que, se juntadas as milhões de

A ignorância é um passo do conflito

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Por Pedro Fernandes É verdade que um país como o Brasil - que viveu tão recentemente um período áureo da censura - faz uso, não muitas vezes exagerado e principalmente em se tratando da mídia, do conceito de censura ou mesmo dos atos praticados nos Anos de Chumbo para classificar todo e qualquer ato que obedeça traços de semelhança não apenas com o conceito mas também com o ato em si de censurar. Isso é fato. Mas, dois recentes momentos que tenho presenciado, não podem entrar para o rol das possibilidades de aproximação com o conceito e ato de censurar. E digo isso porque - na minha curta ignorância - entendo, sim, tais atos como censura. E tenho tanto convicção disso porque acompanho que a grande mídia não se preocupa em colocar esses atos à roda das discussões. A mídia - e restrinjo a grande mídia - só divulga aquilo que lhe é de interesse; aquilo que lhe fere a sua suposta moral. Aquilo que é da moral alheia parece que ela incorpora uma cegueira que está para além

Cesário Verde

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Cesário Verde por Columbano. Fonte: Biblioteca Nacional de Portugal a mim o que me preocupa é o que me rodeia O pensamento que epigrafa esta postagem vem ele marcado pelo laivo do pensamento realista. O escritor é aquele que examina o que lhe cerca - sobretudo o estágio social porque passa o espaço e o tempo em que se insere - e, como um cientista no seu laboratório, executa movimentos precisos de bisturi sobre determinadas questões. Assim, é que nos deparamos, por exemplo, com a ficção de alcova. Se o casamento, artefato de natureza burguesa, dava seus primeiros suspiros de decadência, muitos dos escritores da época - e citemos dois mais conhecidos do grande público, Machado de Assis, da nossa parte, e Eça de Queirós, da parte de Portugal - se deram ao verdadeiro trabalho de retratar essa decadência, bem como de rever outras questões sociais. Cesário Verde é dessa leva. Nasceu em Lisboa, em 1855. Dois fatos influenciaram diretamente na sua carreira de escritor. Um,

Sobre certos individualismos

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Por Pedro Fernandes Clarence Holbrook Carter.  É lastimável o que venho acompanhando em determinados momentos ou situações na web . O primeiro insucesso devo dizer foi quando ainda no jornal Trabuco me disponibilizei a organização de uma antologia de poemas. Na época, a publicação não descolou devido a uma série de desencontros, mas, sobretudo, devido a individualismos da parte de muitos escritores que chegaram a me escrever dizendo não coadunarem com publicações coletivas. Respeito opiniões, mas questiono como que um escritor hoje quer se fazer conhecido (não no sentido de ser famoso, mas no sentido de ser escritor mesmo) se não se mostra entre seus pares. Além do que, seu isolamento só tem a lhe propagar, além da fama de individualista, outra ainda pior, a de não ter capacidade de brilhar numa constelação. Depois lancei-me noutras empreitadas que deram seus frutos. A organização de um miniconcurso literário - Uma página para Saramago - , a organização de uma revista de po

Miacontear - A avó, a cidade e o semáforo

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Por Pedro Fernandes Dois temas são comuns nesse conto. Um, a relação tradição e modernidade - marcadamente pelos espaços e pelas personagens e já expressos no conjunto de substantivos que intitulam o conto: avó, cidade, semáforo. Outro, é novamente o tema da solidão na terceira idade, tema que sustenta a narrativa anterior a esta, Enterro televisivo . Tudo acontece quando o neto de Ndzima, professor numa vila rural, é convocado a receber um prêmio do Ministério. O prêmio deverá ser entregue na cidade grande. E esse acontecimento será motivo suficiente para a avó encher o neto de perguntas, quanto ao lugar onde ele se hospedaria, a feitura da comida, quem lhe faria a cama de dormir... E não convencendo Ndzima sobre todos os trâmites na cidade grande, ela compra passagens e decide abalar junto com o neto numa viagem que, mudará o destino de ambas as personagens. Conduzindo-nos com seu tom galhofeiro o narrador nos relata da viagem, da chegada e dos desentendimentos da avó

A que artista associas teu escritor favorito?

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Por Pedro Fernandes "Carta de amor", Jean-Honoré Fragonard A pergunta veio pelo colunista do  El País  Winston Manrique Sabogal depois de lido do escritor irlandês Colm Tóibín um artigo para o  Babelia , caderno cultural daquele jornal. O artigo em questão tratava do poder subterrâneo da literatura de Hemingway por ocasião do cinquentenário de sua morte feitos no passado 2 de julho. Num determinado fragmento deste texto, Tóibín retoma um fragmento de uma entrevista do escritor americano em que ele afirma que queria escrever como Cézanne pintava.  "Se Ernest Hemingway queria ser uma espécie de Cézanne da literatura, isto é, escrever com a força e a técnica pictórica do grande artista francês do pós-impressionismo, creio que conseguiu em muitas de suas obras, mas com que artista lhe haveria gostado de parecer-se Homero, Shakespeare, Cervantes, Austen, Proust ou a Woolf? Como é muito difícil saber a resposta, me tem ocorrido propor um exercício de sinestesi

Ainda o dia 14 de julho: a Cruviana

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Por Pedro Fernandes Não podia deixar de comentar por aqui acerca do lançamento e da edição da revista  Cruviana . Aquelas ideias que dou apoio e que têm um desfecho além do esperado não podem, claro está, ficar apenas reduzidas às notas de divulgação. É fato que alguns projetos surgidos na  web  e que aqui dou apoio mas perdem-se depois de pronto não carecem de minha parte algo mais que o silêncio. Não devo é agora citar nomes, porque aqueles que me leem com certa frequência haverão de perceber quando falo e quando silencio.  A  Cruviana  teve sua aparição há pouco menos de um semestre. A ideia, tenho notícias, quando seu mentor ainda pensava em chamar esse projeto de  Tramontana . Assim que soube a primeira fase do projeto andava já online postei divulgação por aqui. E agora, depois de, definitivamente pronta, vejo e os leitores que acompanharam esse trânsito – sim, porque a vantagem da internet está na possibilidade de acompanhar boa parte dos movimentos da maquinar

O dia 14 de julho

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Por Pedro Fernandes Numa sessão realizada ontem, 14 de julho de 2011, no Auditório da Biblioteca Municipal Ney Pontes Duarte, em Mossoró, foi apresentada uma edição especial do Caderno-revista 7faces . A sessão que teve início ainda pelas 18h, no hall da biblioteca, ao som fabuloso do grupo de músicos do Projeto ECOARTE, foi realizada em parceria com a apresentação de outra revista eletrônica: a Cruviana ; com gravação do programa Pedagogia da Gestão para a TV a Cabo de Mossoró (TCM).  O desfecho desse momento se deu com um agradável bate-papo entre Pedro Fernandes (professor e editor deste blog e do Caderno-revista ), José de Paiva Rebouças (jornalista e editor da Cruviana ), Clauder Arcanjo (professor, poeta e editor da Sarau das Letras ), Ivanúcia Lopes (jornalista, blogueira e autora de um dos textos publicados na edição da Cruviana ), Esdras Marchezan (professor) e Anchieta Rolim (artista plástico). Tudo regado aos versos do poeta Antonio Francisco. Fotografia: Maria

Um ano depois, um esboço sobre a face poética de José Saramago

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Por Pedro Fernandes Capa da edição especial do Caderno-revista 7faces É evidente que não vou, a poucas horas da apresentação oficial sobre o número especial do Caderno-revista 7face s, intitulada Variações de mesmo tom: diálogos sobre a poesia de José Saramago ,   contar todo trabalho empreendido em ano até a chegada deste resultado final; depois voltarei ao assunto, é verdade. Este texto, aliás, é só um motivo de reforçar o convite que postei por aqui  outro dia. Alguns interessados já terão contato com esse assunto neste dia 14/07/2011, às 19h, no auditório da centenária Biblioteca Municipal Ney Pontes Duarte, situada à Praça Dorian Jorge Freire, em Mossoró, RN.  Só devo adiantar por aqui, um ano depois, da satisfação que é ter essa edição pronta, porque nesse período os percalços foram muitos e ainda estão sendo. Mas, os leitores brasileiros terão ao alcance, em mídia eletrônica e distribuição gratuita, como é o papel do   Caderno-revista 7faces , uma edição que reúne ens

Miacontear - O caçador de ausências

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Este conto retoma aquele fio do fantástico instalado em narrativas como O homem cadente . Como a história de O peixe e o homem , que o tom anedótico sustenta uma narrativa de pescador, em  O caçador de ausências novamente esse tom é o que sustenta a armação do texto assemelhando-se a uma historieta das muitas contadas por caçadores. O narrador tem com Vasco Além-Disso Vasco - nome que reitera possível significação na ordem dos grandes navegadores - uma enorme quantia em dinheiro a receber. A narrativa nasce da sua ida um dia à casa do mal-pagante a fim de receber os devidos. Descobre que Florinha, mulher de Vasco e com quem o narrador já se 'enrabichara' certa vez, fugiu de casa e, por esse motivo, está Vasco incomunicável, ausente de si, não quer contato com ninguém de tão mergulhado na tristeza. O fato é suficiente para desencadear na personagem a inauguração de um trajeto mato adentro, à procura não se sabe de quê, se de uma tranquilidade para acalmar-lhe os nervo

Os filmes de Fernando Pessoa

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Já não é possível chamar Fernando Pessoa apenas de poeta, embora, é claro, sua obra do gênero seja a mais volumosa e também o melhor que produziu. Mas, constantemente, do trabalho desenvolvido pelo grupo coordenado por Jerónimo Pizarro descobrem-se coisas que não são da alçada do poeta, mas de um sujeito que experimentou todas as possibilidades de exercício da faculdade imaginativa.  Exemplo disso é o anúncio agora da Casa Fernando Pessoa sobre a publicação de uma obra que traz à luz um homem metido com a arte do cinema. A edição, introdução e tradução são de Patrício Ferrari e Cláudia J. Fischer; a tradução é porque grande parte do material agora apresentado foi organizado pelo próprio Fernando Pessoa em língua inglesa com o rótulo de  Film Arguments . Além de roteiros em inglês, o multi-criador escreveu outros em português e em francês.  O título editado preserva o nome dado pelo seu mentor, Argumentos para filmes . Na edição, seis roteiros incompletos, escritos ainda na

Revista dedicada à obra poética de José Saramago

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Pedro Fernandes, o editor deste blog, está satisfeito com os resultados colhidos depois de um ano de intenso trabalho. No próximo dia 14, acontece no auditório da Biblioteca Municipal Ney Pontes Duarte, situada à Praça Dorian Jorge Freire, s/n, Mossoró, a apresentação de número chamado de especial sobre a obra poética de José Saramago.  O acontecimento se dá entre uma série de atividades marcadas para as 19h: além da edição do Caderno-revista 7faces , será apresentado o primeiro número da revista de contos, Cruviana .  Durante a sessão será gravado uma edição especial do programa Pedagogia da Gestão para o canal 10 da TV a Cabo de Mossoró (TCM).  Estarão presentes o editor do Caderno-revista 7faces , o editor da revista Cruviana , o jornalista José de Paiva Rebouças, o professor Esdras Marchezan e o poeta e contista Clauder Arcanjo. A sessão tem entrada franca, até à lotação do auditório. A edição sobre a obra poética de José Saramago traz ensaios de autores brasi

Maurice, de E. M. Forster

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Por Pedro Fernandes Quando escreveu o ainda útil livro Aspectos do romance , E. M. Forster já era um autor de reconhecido sucesso, não só porque seus romances eram de agrado do público leitor, mas porque estava claro o esmero com que lapidou suas narrativas e construiu suas personagens; a menção ao livro que se tornou referência indispensável entre os estudiosos da literatura é para corroborar a pertinência, ao menos no âmbito da narrativa romanesca, dos conceitos aí formulados: não tiveram outro ponto de partida que o seu próprio exercício com o objeto narrativo, com o desenho do quadro psicológico com que deu força aos seus seres ficcionais e, claro, a extensa vivência como leitor. E é dessa vivência que Forster volta ao conceito de amor, colhido nas referências demonstradas em Maurice de lugares como da cultura grega aí designada por nomes como Platão e Sócrates, e faz do tema uma obsessão variada para a composição de seus enredos; pode-se dizer isso quando, d

Os desenhos de Kafka

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"O pensador".   Kafka incluiu esse desenho numa carta para a companheira, Felice Bauer, de janeiro de 1913. "Meus desenhos não são imagens, são uma escritura privada" (Franz Kafka) Editado em Espanha, os leitores de Kafka podem admirar uma outra face da obra do escritor tcheco: a dos desenhos. A obra lançada esta semana reúne um conjunto de 40 ilustrações que marcam uma retrospectiva do trabalho com desenho feito pelo autor de A metamorfose . O interesse e a paixão do escritor pelo desenho, e pela arte em geral, foi tal que com 24 anos ainda não sabia se queria ser um sujeito dedicado a criar imagens como esta que abre e as que ilustram esta postagem. Nos trabalhos apresentados no livro  Franz Kafka: desenhos  não é possível, na grande maioria dos casos, precisar qual a técnica empregada pelo escritor - se feito a lápis ou a pincel. Sabe-se apenas que seus desenhos são lidos ora como expressionistas pelo seu amigo e artista Fritz Feigl, ora como realis

E a culpa, de quem é?

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Por Pedro Fernandes A leitura , de Pablo Picasso A revista Cult , de posse de dois assuntos - as vésperas de mais uma edição da Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e da eleição da cidade argentina de Bueno Aires como a capital mundial do livro - volta à inquisidora pergunta: o que há de errado no Brasil que coloca os hermanos argentinos sob a posse de um título do tipo. Para isso, a revista deu-se ao trabalho de ouvir alguns nomes a fim de que eles apresentassem sua opinião acerca dessa situação. Colocando-me como um dos perguntados e como leitor e admirador da Cult é que redijo essa breve  nota brevis . O problema da leitura no Brasil é, sim, embora não pareça, um assunto sério, tão sério como as famigeradas questões econômicas que rodam todos dias nos jornais. Aproveito para antes dizer que as opiniões apresentadas na reportagem, em sua grande parte bem-intencionadas, faltam numa coisa: tirar o olho do próprio umbigo para olhar mais amplamente a questão. Uma d

Miacontear - Entrada no céu

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Por Pedro Fernandes Cena da adaptação para o cinema de  O auto da Compadecida . No conto de Mia Couto, "Entrada no céu", a personagem vive um dilema com simbólico semelhante ao que vivem as personagens do auto de Ariano Suassuna. Usando de um tom anedótico e confessional este conto traduz as inquietações de um negro africano diante de algumas 'formulações' católicas caras ao entendimento daqueles que mantém um contato com o simbólico por outra via que não o total abstracionismo da religião ocidental. Digo isso, mas boa parte das inquietações dessa personagem são inquietações, inclusive, de muitos que nasceram num berço cristão. A imagem do paraíso celeste com sua enorme placa "Welcome to paradise!" ou a de grande tribunal a averiguar todos os fatos da existência das pessoas, por exemplo, são imagens que muitos de nós, quando crianças, fizemos. O choque, portanto, que aqui se constata está para além das culturas, está na própria relação do homem