Redes sociais para quê?*




1. Tem cinco anos que criei o blog Letras in.verso e re.verso. A ideia – como aparece justificada na apresentaçãodo espaço – se deu quando, em 2007, eu ainda aluno de graduação em Letras ia ministrar um curso sobre a poeta potiguar Auta de Souza. Pela ocasião eu havia redigido um texto que mais tarde foi publicado numa revista acadêmica da Universidade Federal de Santa Catarina intitulado “Auta de Souza in verso e[re]verso, sob o onírico e o etéreo, reflexões poéticas”. Não precisa dizer que a origem do in.verso e re.verso vem do título desse texto. Até uns dois, três anos depois da criação do blog, a grafia do seu título era a mesma a que dei ao texto – in verso e [re]verso; somente com a reestruturação do espaço foi que passou para a grafia que leva até o presente.

Quando fiz minha primeira incursão pelo universo das redes sociais, ainda com o antigo Orkut em 2008, eu utilizei a minha página pessoal para divulgação da publicação dos links que davam acesso às matérias publicadas no blog. Depois, criei uma comunidade para esse propósito. Tudo foi desfeito quando abandonei o Orkut dois anos depois pelo Facebook. Na nova rede social o trajeto cumprido foi o mesmo que anteriormente: os links iam para minha página pessoal e depois foi criada a fan page, nome dado para uma página social mais livre e aberta a uma quantidade infinita de simpatizantes com a ideia. De 2012 para cá, a fan page, graças a ajuda de amigos, cresceu o suficiente para apresentar alguns problemas que nunca passa pela cabeça de quem anda a se aventurar por essas sendas virtuais.

A criação de um espaço paralelo como a fan page cumpre ser um complemento do que é publicado no blog. Seguindo os mesmos eixos daquilo que é matéria por aqui, isto é, os temas Literatura, Artes e Comportamento, ela tem por missão explorar com maior destreza e rapidez determinados assuntos impossíveis de ser tratados, na atual conjuntura, por um blog. Aliás, esse tem sido o papel das redes sociais, elas reinventaram o modo de fazer blogagem; se antes esses espaços se comportavam mais como um diário aberto, hoje o que eles querem é conteúdo de qualidade e têm muitos blogs que cumprem o fluxo de um site, por exemplo.



2. Um dos problemas apresentados chegou a servir de comentário publicado na fan page e de reformulação dos sentidos para o espaço (conforme pode ser lido aqui). Achei por bem que a coisa se estendesse também para cá e reformulei alguns pontos no texto de apresentação do blog. É que algumas fan pages criadas muito antes da do Letras e com um grupo muito maior de seguidores e outras fan pages menores têm a todo custo se apropriado de materiais produzidos por quem cuida daquele espaço e publicado como sendo seus e em casos mais sérios – como detectamos já algumas vezes – o material é descaracterizado ou utilizado como sendo da autoria dos mantenedores do outro espaço.

E isso é evidente, é uma dor de cabeça. Por mais que tenhamos a capacidade de rastreamento para esses comportamentos, a web é infinita – não exercemos controle sobre ela. E as publicações de notas de orientação ou de reformulação de apresentações com direção a este lugar de orientar pode ser somente um tiro no escuro. Essas atitudes de uso e apropriação indevida é caso grave não apenas pela desconsideração do trabalho do autor, mas pela incapacidade de uso adequado de determinados meios que web oferece livremente a todos. Se já se confundia o conceito de liberdade com libertinagem, as redes sociais aceleram essa ainda mais essa confusão, mesmo considerando que espaços como o Facebook têm não apenas subterfúgios para zelar até onde alcance pela identidade do autor – a ferramenta de compartilhar é uma delas e de denúncia é também outra, mas com eficácias muito curtas se pararmos para ver que vai da consciência de cada um compreender o que significa o zelo pela fuça do autor e as formas e usos do que ele encontra nas redes sociais.

Considero este o grande mal das redes sociais: o apagamento da autoria e a redução do autor à condição fajuta. Essa situação é a prova definitiva de que dá voz às pessoas não é suficiente para fazer um povo instruído ou comunicativo. É preciso, antes disso, educar as pessoas para o que significa ter voz e quais os limites dessa voz: onde finda sua liberdade e onde começa a do outro. Digo isso pensando em muitos comentários já soltados pelas redes de que o espaço é meu e eu publico o que quiser. Essa condição de liberdade total e irrestrita é produto de um simulacro: não temos essa condição de liberdade, e se tivéssemos, penso, seria um caos. Aliás, já estamos quase lá. Esse lugar em que todos são estrelas para todos, tem produzido cada vez mais o distanciamento entre eu e o outro e reduzido cada vez mais nossa capacidade de lidar com as fronteiras entre o eu e outro.

Se alguns princípios, como saber onde finda sua liberdade e principia a alheia, já não existem fora do espaço virtual porque tenho percebido cada vez mais que nossas individualidades têm apagado a existência do outro, num espaço virtual em que o rosto pode se esconder por detrás de uma marca ou uma imagem qualquer, e todos se sentem à vontade para exercer o que em hipótese alguma seriam capazes de exercer fora desse âmbito, a coisa é mais complexa.

As redes sociais chegaram a todos como chegou a internet. Todos se sentem livres para o que quer e não enxergam um palmo adiante o que determinadas ações são capazes de ferir a liberdade alheia. Sem qualquer instrução fomos colocados diante da liberdade – não nos disseram direito para que servia essa parafernália toda e com o tempo alguns vão aprendendo por conta própria enquanto outros vão se aperfeiçoando na arte do uso indevido. Entendo, agora, perfeitamente o medo que tem os dos países mais fechados na liberação total da web aos seus cidadãos; pode ser que estejam certos. E pode ser que alguns truques venham fazer deles usuários que façam melhor uso das ferramentas que a internet lhe proporciona. Porque por aqui ainda levaremos muito tempo.

Continuamos numa balbúrdia, onde todos falam e ninguém ouve. E quando ouve distorce porque não compreende ainda qual é realmente o sentido de um lugar como o Facebook. Quem chegou primeiro pela rede de Zuckerberg compreende bem como isso foi se deteriorando e encontra-se na completa muvuca que se encontra. Talvez num futuro não muito distante se pense numa avalanche de instrumentos educativos que nos diga e mais ainda aos menos instruídos qual a função disso tudo e então possamos fazer o uso devido dessas “ferramentas de liberdade” que temos construído; como está, a tendência é permanecer num espaço sem sentido algum, onde uns repetem o que os outros remedam dizer e, fiquemos, no fim de tudo reféns numa sala de espelhos. É caso que já não se produzem mais narcisos como antigamente.


* conjunto de notas para um texto a ser editado para o jornal.


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